História
da Escola de Enfermagem da UFF
Em 1860, surge na Inglaterra
a enfermagem moderna ou profissional que capitaneada por Florence Nighthingale,
cria o sistema Nightingale o qual subsidia toda uma nova forma de fazer e de ensinar
enfermagem, caracterizada por um rígido controle moral, uma atuação técnica a partir
de princípios científicos, exercida por mulheres jovens, predominantemente no espaço
hospitalar e obedecendo aos princípios da organização capitalista do trabalho.
"A profissionalização da enfermagem através da "Revolução Nightingale", se efetivou com a formação de duas categorias distintas: as "nurses" e as "ladies-nurses", colocando em evidência a divisão saber/fazer na enfermagem, como também refletindo a divisão de classes existentes nas sociedades capitalistas. As nurse, provenientes de classes sociais de baixa renda possuíam preparo bastante simples e realizavam os trabalhos manuais, sendo responsáveis pelo "fazer", correspondem hoje às auxiliares de enfermagem. Já as ladies-nurses pertenciam as classes mais elevadas, com preparo técnico-científico, o que lhes conferiam "saber"e a este saber algum poder, mesmo que apenas no interior da categoria de enfermagem" (DAHER,1995).
Em 1920 foi criado no Brasil o Departamento Nacional de Saúde Pública, com o objetivo de organizar o serviço sanitário no país. Neste contexto, surge em 1923, segundo o modelo Nightingaliano a primeira Escola de Enfermagem, Escola Anna Nery.
No Brasil, o modelo Nightingaliano foi então adotado a partir de 1923 sob o modo de produção capitalista e se organiza dentro de seus preceitos, isto é, basicamente dentro do espaço institucional hospitalar já organizado (MENDES, 1993).
O currículo para a formação dos enfermeiros nasce para atender aos interesses políticos e econômicos hegemônicos. No período de 1923 à 1945 enfatizava-se a área da saúde pública, entendida como combate às epidemias que prejudicassem o comércio exterior, restrita às principais áreas portuárias do país, atendendo as metas governamentais e ao mercado de trabalho da época.
Com o início da industrialização e urbanização brasileira, surge a necessidade de proteger a população produtiva, o que veio a exigir a prestação de assistência médica individual, priorizando a prática hospitalar e a necessidade de pessoal de enfermagem qualificado para atender esta demanda. Esta situação exigiu a expansão do número de Escolas de Enfermagem, motivando a criação da Escola de Enfermagem da Universidade Federal Fluminense, findada em 1944 em Niterói.
Retrocedendo a essa época, podemos perceber algumas razões que motivaram a sua fundação em território fluminense. O mundo vivia a segunda Guerra Mundial e o Brasil era um país estratégico para o objetivo dos aliados de ganhá-la o mais rápido possível: rico em matéria prima indispensável para a produção de material bélico pesado e localização privilegiada, principalmente para as batalhas em solo africano. (SOBRAL,1994).
Paralelamente, o país vivia um momento político delicado, e o estado do Rio de Janeiro, onde se localizava a capital do país, estava sob intervenção federal do governo trabalhista de Getúlio Vargas, e seu interventor era Ernani do Amaral Peixoto. O país atravessava um caminho precário para o desenvolvimento, destacando-se as péssimas condições de saúde da população e a deficiência qualitativa e quantitativa dos recursos humanos para o enfrentamento necessários aos desafios emergentes.
Ao aderir a Segunda Guerra, o Brasil além de enviar um grupo das forças armadas à Itália, ofereceu os seus recursos materiais e o porto de Recife para apoio às manobras de guerra. Em troca, ganhou dos Estados Unidos da América financiamento para agricultura e saúde, além de técnicos para assessorar a implementação de projetos nessas áreas. (SOBRAL,1994).
Um dos resultados desse processo é o projeto de criação de uma Escola de Enfermagem em Niterói, que teve como marco a influência política de Alzira vargas, esposa do governados do estado e irmã do Presidente da República, uma entusiasta da enfermagem brasileira.
Segundo FERNANDES (1964) "o país, no ano de 1943, dispunha apenas de cinco escolas equipadas e reconhecidas e 2500 enfermeiras, número estes pouco significativos em relação ao aumento populacional intenso, a natural expansão da rede hospitalar e a necessidade premente de programas sanitários. Por outro lado, surgiu a idéia de que antes da criação de qualquer serviço de saúde, era imprescindível prover, para a lotação dos mesmos, equipes que contassem não só com a presença de um ou dois médicos em cada unidade, como também com pessoal de preparo técnico profissional".
Assim é que, em 19 de abril de 1944, através do Decreto n 1.130 é criada a Escola de Enfermagem como escola isolada e reconhecida através do Decreto n 22.526 de 27 de janeiro de 1947, objetivando o preparo de enfermeiras de alto padrão para os serviços de saúde pública e hospitalar. A mesma ficou subordinada, de acordo com o art. 2 desse mesmo Decreto, ao Governo do Estado do Rio de Janeiro até 11 de março de 1950, quando por Ato Governamental, foi criada a Universidade do Estado do Rio de Janeiro que integrou dentre diversas escolas e faculdades, a Escola de Enfermagem. Em 1 de fevereiro de 1945 é realizada oficialmente a abertura do Curso de Enfermagem com a aula "História e Finalidade da Enfermagem" proferida pelo Professor Marcolino Candeau, representante da OMS no Brasil.
Em 18 de dezembro de 1960, a lei n 3848 federalizou a Universidade do Estado do Rio de Janeiro. No início do ano seguinte, o grupo de escolas agregadas à UFERJ, dentre as quais a Escola de Enfermagem (EE), foi federalizada, pela lei n 3958 de 13 de setembro de 1961 e, entre outros dispositivos legais constava o que criava 14 cátedras para a EE.
A primeira diretora nomeada, professora Aurora Afonso Costa, graduada pela Escola de Enfermagem Anna Nery, permaneceu no cargo por 22 anos. Neste período, o seu maior legado foi a conquista das 14 cátedras de enfermagem preenchidas somente por enfermeiras docentes, num enfrentamento de "guerra" com alguns médicos, inclusive com batalhas judiciais. Merece destaque, entre outros acontecimentos descritos por FERNANDES, a participação da Escola de Enfermagem no planejamento e organização do Hospital Municipal Antônio Pedro (1951) cabendo a responsabilidade à direção da Escola de Enfermagem, que designou seus docentes para o projeto em causa, situação que persististe até hoje. LIMA et al. (1983), referem-se a criação da Subdiretoria de Enfermagem do HUAP - Resolução n 155/75 do Conselho Universitário, atualmente Diretoria de Enfermagem, gerenciada por um docente desta instituição.
A partir da agregação da Escola de Enfermagem à UFERJ foi exigido, para o ingresso à mesma, o certificado do segundo ciclo colegial, estabelecendo-se no Regimento Interno que o Curso de Enfermagem seria de três anos, em regime de internato e intensivo.
FERNANDES registra que "surge, em 1958, nova experiência pedagógica constituindo em distribuir o currículo do curso de enfermagem em 4 (quatro) anos letivos, incluindo os 3 (três) meses de férias anuais" em substituição ao acima referido intensivo de três anos.
Em 1961, após a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases, coube ao Conselho Federal de Educação, legislar sobre o currículo dos cursos superiores. Assim, em 1962, o parecer 271 do CFE aprova o currículo dos cursos de enfermagem com duração de três anos e cria os cursos de especialização de caráter optativo. Segundo SILVA (1994) esse currículo é predominantemente voltado para atender às necessidades do mercado de trabalho, com enfoque para área hospitalar. MENDES (1991) lembra que "Neste modelo de currículo foram excluídas as Ciências Sociais e colocada a Saúde Pública como Especialização".
A aprovação desse currículo trouxe insatisfação para as enfermeiras docentes e membros da ABEn, gerando discussões em toda a década de 60. A categoria reivindicava o aumento de três anos para quatro anos letivos na tentativa de melhorar a qualidade do ensino e como forma de atender as reais necessidades de saúde do país.
A política educacional imposta a partir de 1968 com a Lei 5540 e o Decreto Lei 464 de 1969, "visava integrar a educação à nova opção de política econômica que foi sugerida e orientada por americanos e aberta aos interesses estrangeiros. No ensino superior, particularmente, aplicou-se a ideologia do progresso empresarial, marcado pelo arbítrio, pela falta de liberdade bem como pela censura com dificuldade para o exercício da crítica e da criação." (MENDES,1993).
Todas estas questões refletiram-se direta e profundamente no cotidiano da enfermagem, que continuava atendendo às políticas do estado, com baixo nível de questionamento de suas práticas.
É importante lembrar que a saúde no Brasil foi, durante muitos anos, vista sob a égide meramente tecnicista. Esse modelo favorece a dicotomia saúde/doença, prevenção/cura, e exerce hoje grande influência na construção da identidade profissional do enfermeiro.
Na década de 70, com a contribuição das Ciências Sociais, passa-se a compreensão da saúde do ponto de vista da determinação social e da crítica do papel do estado, culminando com reflexões novas na área da saúde e estas perpassam também a categoria de enfermagem.
Em 1972 é aprovado o parecer 163/72 do CFE, regulamentada pela resolução 04/72, estabelecendo um novo currículo mínimo dividido em ciclo pré-profissional, tronco profissional comum e três diferentes habilitações (Enfermagem Obstétrica, Enfermagem Médico-Cirúrgica, Enfermagem Saúde Pública), privilegiando sobretudo o ensino centrado no modelo médico de assistência hospitalar.
Ainda nessa década, foi aprovada a nova Lei do Exercício Profissional de Enfermagem (LEP) após tramitação de dez anos no Congresso Nacional.
Na década de 80, durante o processo de redemocratização no país, surgiram propostas de reformas e organização dos serviços de saúde. Advém desse conjunto de movimentos, estudos e eventos culminando num processo histórico de uma proposta nacional de currículo mínimo para a formação do(a) enfermeiro(a). Esse processo esteve sob a coordenação da Comissão de Educação (CE) da ABEn, Comissão de Especialistas da Secretaria de Ensino Superior do Ministério de Educação e Cultura (SESU/MEC).
Conseqüentemente, intensificaram-se as discussões da comunidade de Enfermagem a nível regional e nacional, que apontava para uma estrutura curricular que sinalizava alguns avanços em relação ao processo de formação do profissional enfermeiro, através da reorientação do ensino de Enfermagem tecnicista e curativa para generalista preventista.
A promulgação da portaria MEC de número 1721 em 15/12/94, que determina o novo Currículo para o Curso de Graduação em Enfermagem, se constitui o marco nacional da década de 90. este momento da enfermagem brasileira é coincidente com os 50 anos da escola de Enfermagem da UFF, marcado entre outros acontecimentos, pelo lançamento de um carimbo comemorativo do Jubileu de Ouro Vinheta pela Empresa de Correios e Telégrafos.
Paralelamente a estes acontecimentos, intensificaram-se os estudos do currículo da EEUFF por parte da comunidade acadêmica numa forma de construção coletiva, culminando com a sua aprovação no Colegiado do Curso de Enfermagem em 18/10/95, data do aniversário de criação desta instituição.