A Maioria dos excelentes discos que eu já ouvi e ouço, porque já me acostumei a idéia de que bastam cem discos para você saciar toda sua fome de música, tem como figuras essenciais ritmistas, os quais eu admiro tanto que dói. Me lembro de quando eu era uma criança e as pessoas queriam ser guitarristas, solistas como Stevie Vai ou Joe Satriani, tocar uns rocks velozes como os do Megadeth. Pô, os três primeiros discos do Metallica o meu irmão mais bonito tem, eu já ouvi muito tudo aquilo e acho autêntico pra caralho, mas não é a minha música preferida. Mas lá nos idos de 92 o que pegava em Brasília era o Metal, não esse metal Massacration que de tão bom me dá uma certa nostalgia a lá Mamonas Assassinas, esta sim, um fenômeno do excraxo ridículo, que salve-se o Premeditando o Breque, coisa sensacional e marcante de minha infância, e os músicos da época iam ter aulas na Musimed com o Parente e com o Fred. Eu mesmo fui aluno por dois meses do Fred, mas algo chamado dinheiro, depois a preguiça de andar de ônibus duas vezes por semana com o baixo no lombo me fizeram acreditar que eu era capaz de aprender a tocar baixo sozinho. Foi a melhor decisão que eu já tomei na vida. Me guia até hoje por qualquer caminho. Tocar a vida sozinho. A raça mais difícil de encontrar pra fazer um som legal é baterista. Na época tinha o César Borgatto, eu achava ele um baterista de merda, mas adorava as técnicas que ele usava pra tirar um som. Eu pensava “preciso de um Borgatto mais porra louca, mais novo e que não seja careca!” Tinha um fenômeno da bateria chamado Maurício, um desses talentos genuínos que o pai apoiava porque é assim que um pai tem que agir. Tinha 13 anos, tocava Pink Floyd, Led Zeppelin e tinha pratos Zyldjan, todos. Aquilo me motivou. Eu tinha 16 anos, era mais velho, mais pobre e não tinha apoio algum em casa pra levar música a sério. Por isso mesmo que um baterista sério seria a chave para que uma banda desse certo. Se fizesse os meus pais rebolarem o jogo estaria meio-ganho. A outra parte, é claro, era a escola. Sempre ensaiei em casa com meu irmão gêmeo e o meu irmão mais novo ensaiava com a banda de rock psicodélico dele. Tinha um menino canhoto-guitarrista chamado Filipe, o cara mais talentoso que eu já vi tocar guitarra e, com um detalhe, com o coração. Ele era o hendrix, pra mim. E é sério quando eu digo que ele era o HENDRIX. Canhoto, solista e compositor e extremamente livre dedilhando sua péssima guitarra, uma Jennifer Strato. Que guitarrinha ruim! Mas o menino era fantástico e motivava todo mundo, eu e a minha banda, a banda dele todinha, meus pais e a vizinhança sentava na varanda, um dos meus vizinhos fumava um e ficava ouvindo a gente tocando The Beatles, Nirvana, Smashing Pumpkis, The Pixies, Led Zeppelin, Rolling Stones, Mutantes, Raul Seixas, The Smiths, Pink Floyd e todas as nossas composições. Era o nosso Woodstock porque, pra melhorar tudo, tinha platéia feminina. Isso era um hábito desde que eu me entendo por banda. Minha primeira banda, os The Sounders, tinha esse apelo feminino. A gente convidava as amigas da escola pra ir ouvir a gente ensaiando The Beatles, Raul e Roberto Carlos, tomar banho de piscina. Todo Sábado na casa do James, onde começou a minha crença de que toda banda boa não ensaia em estúdio pago. Pagar pra tocar dói muito! O menino Hendrix-Filipe foi a excessão sobre guitarra que eu já vi. Ele explodia ao vivo, solava muito bem e tinha espírito, um feeling pro bom gosto da porra. Meu irmão gêmeo é outro excelente guitarrista porque sabe criar harmonias que cantam, dobram a voz. Isso, depois que eu descobri o Jazz, é a coisa mais linda a se fazer em uma música. E se o guitarrista for bom, a magia fica rock n'roll. Tanto que os quartetos de Jazz mais famosos do mundo NUNCA tiveram um guitarrista. O baterista que tocou comigo durante anos era musical, esforçado, mas era uma merda. A minha mãe costumava dizer que o esforço que eu colocava individualmente e na própria banda era desequilibrado, superior ao dos demais integrantes. Na época eu achava isso um absurdo, mas hoje eu dou razão a minha mãe. Todos os dias eu e o Breno tocávamos de manhã, antes de ir pra escola, de tarde, de noite. Todos os dias, mais os ensaios de Sábados e Domingos. E, no fundo, por ser autodidata, eu via que me desenvolvimento musical era lento, progressivo e estiloso. Uma coisa eu aprendi. Ninguém toca como eu. Ninguém mesmo. Já me convenci que uma das razões pelas quais eu apoie o experimentalismo em todos os sentidos é o fato de que a auto-influência somada a convivência com o meio será capaz de dar instrumentos para que cada um seja bom naquilo que se dedica. Meu colega baterista era baterista de final de semana. Pra mim isso nunca bastou. Quando eu entrei no Maskavo eu percebi que tinha muita coisa a aprender sobre baixo. O reggae estava em minhas veias, mas não nos meus dedos e no meu coração. Com o Prata, com o Quim e com o Marceleza eu pude extrapolar, dar vazão a um coisa que eu sempre admirei no contrabaixo: a capacidade instrumental de poder ser um instrumento melódico e rítmico. Nas minhas experiências e músicas anteriores eu conseguia, de uma certa maneira, ser melódico. Mas o rock, em si, faz o baixo parecer muito mais um som profundo e presente do que pontuante e misterioso. James Jamerson, Jimmy Garrison, Sting, Andy Rourke, o cara do New Order, Geddy Lee são alguns exemplos de contrabaixistas que iam além do instrumento e de suas limitações. Um instrumento de 4 cordas muito elegante, inclusive. O reggae, com Aston Barret e Robbie Shakespeare, pra mim não seria nada sem Carlton Barret e Sly Dunbar. Os dois melhores bateristas do MUNDO! Tem uma caralhada de caras bons no rock, Stuart Copeland, John Boham, Mitch Mitchell, etc, mas esses dois jamaicanos deram o toque final que mais influencia as batidas de dance no mundo hoje em dia. O Raggamuffin, o DanceHall, o Funk, o HipHop, o Rap, o Reggae, o Rock. Eis que o up-down beat do reggae dominou o mundo sobre a forma de uma quimera, uma Hidra de Lerna de 200 cabeças. Mas ninguém se pergunta de onde vem e pra onde vai o reggae? Eu me pergunto todos os dias porque eu gosto tanto de reggae e de jazz, afinal são músicas genuinamente mestiças, como o forró, o baião, o xaxado, o bumba-meu-boi, muitas outras que eu não conheço. Aprendi a gostar de músicas dos orixás, a música da Bahia antiga e mística e brasileira, da música chamada Bossa Nova e estou aprendendo violão. Que instrumento bonito e charmoso. Se tiver um bom percussionista, então...

2005