Veio Ver VERÍSSIMO ?
Colaborações
- Amélia - disse ela.
- Como a mulher de verdade? - perguntou ele. Ela não entendeu.
- Que mulher?
- A da música. A que podia passar fome mas não reclamava.
- Bem capaz!
Ele a perdoou por não conhecer a música. Afinal,
a música era
mais antiga do que ele. A perdoaria por qualquer coisa. Ela era
linda.
Ela tinha o queixinho pontudo.
- És de Porto Alegre mesmo?
- Passo Fundo.
- Epa. De faca na bota.
- Bem capaz!
Conversaram a noite toda. Ou ele conversou. Ela ouvia. De vez
em
quando fazia "hm-hm". Quando se despediram, ele perguntou
se poderia
vê-la no dia seguinte.
- Bem capaz!
- Por que não?
- Eu trabalho, né?
- Depois do trabalho.
- Tá.
Viram-se no dia seguinte e nos dias depois. Encontraram-se todos
os dias durante a semana. Ele apaixonado. Ela só ouvindo
e de vez em
quando fazendo "hm-hm". Até que um dia ele disse:
- Quero dar um beijinho bem aqui.
E apontou para o queixinho pontudo.
- Bem capaz!
- Deixa.
- Bem capaz!
- Por que não?
- Bem...
- Não diz "bem capaz".
- Digo o que eu quiser. Eu, hein?
- Amélia, eu...
Mas ela já tinha levantado da mesa. Ele estava pensando
o quê? Que
mandava nela? Só porque tinham saído juntos algumas
vezes? Bem capaz!
Ele só agüentou dois dias. No terceiro, telefonou.
Pediu perdão.
Não sabia o que dera nele, para falar daquele jeito. Adorava
o jeito
dela falar. Poderia vê-la outra vez?
Silêncio. Ela vai dizer "Bem capaz", pensou ele,
e eu vou me
suicidar. Ah, vou. Vou me atirar de cima do Viaduto. Afinal, sou
um
cara antigo.
Mas ela disse: "Tá".
Reencontraram-se, casaram-se e ainda ontem ela deu entrada no
Pronto-Socorro com o queixo fraturado. Foi ele. Até que
agüentou muito.