Grupo de Trabalho Pelo Fechamento da Febem Av. Sto . Amaro nº 4162 - CEP 04556-000, S. Paulo - S. Paulo, NEPPAL - tel.: 5677-8913 c/ José Roberto Grêmio SER Sudeste - tel./fax: 5565-7012 c/ Mauro A. Silva IDEAMOS - c/ Cida Gomes Escreva para o Grupo |
Vinculado ao Movimento Comunidade de Olho na Escola Pública R. Luis Góis nº 1337, CEP 04043-350, S. Paulo/SP- tel. fax: (0xx11)5565-7012 |
=======================================
Em 23 de outubro de 1997 foi ouvido o depoimento do DR. Flávio Américo Frassetto, Procurador do Estado, da Procuradoria de Assistência Judiciária Criminal - defesa de adolescentes infratores -, Coordenador do Grupo de Procuradores do Estado da Infância e Juventude que fez o levantamento da situação legal dos adolescentes internos na FEBEM.
A Procuradoria de Assistência Judiciária atua na defesa do adolescente infrator, durante o período de internação, desde o processo judicial, até a aplicação e execução da medida. A sistemática de trabalho inclui visita diárias às Unidades da FEBEM, atuando diretamente com os técnicos e adolescentes internados.
A Procuradoria encaminhou um relatório ao Governador do Estado, feito com o objetivo de rever a situação jurídica dos adolescentes, através do exame individual de cada caso, e identificação de adolescentes que estivessem cumprindo medidas de internação em condições contrárias ao que prevê o ECA.
Em termos jurídicos, embora se tenha constatado uma ou outra irregularidade, em geral os adolescentes que lá se encontram internados, estão com fundamento na lei. Pode-se até discutir se é a melhor ou pior interpretação da lei, mas não há muitos casos de ilegalidades flagrantes.
O que se pode constatar é que um dos motivos das fugas é a superlotação, pois gera uma precariedade na estrutura, que não é adaptada, e o tratamento passa a ser mais severo, com maior preocupação com a segurança e piores condições de contenção.
Em relação à questão da superlotação, há muitos casos de adolescentes internados que não precisariam estar lá , caso a interpretação que o Judiciário desse ao ECA fosse de fato como imaginamos que deveria ser dado.
A medida de internação é uma medida excepcional, que só deve ser aplicada aos casos de adolescentes, com os quais tenham sido testadas outras medidas que não impliquem em privação de liberdade, e que se mostraram inadequadas ou não atingiram seus objetivos.
A internação deve ser utilizada o mínimo possível, e deve durar o mínimo possível, pois vários estudos já provaram que a institucionalização muito pouco traz em termos de ressocialização e favorece a marginalização. Inclusive a simples gravidade do ato infracional praticado pelo adolescente não poderia ser o único motivo para aplicação da medida.
A legislação relativa ao adolescente infrator é liberal, na medida em que diz que ele é inimputável, não responde criminalmente pelos atos que pratica tipificados como crime, não tem responsabilidade penal e seu tratamento tem que ser diferenciado, baseado na ressocialização, que não é favorecida pela institucionalização.
Na prática da aplicação da lei pelo Judiciário percebe-se que isto não ocorre. Muitos casos que efetivamente poderiam ser reeducados junto à família ou através de outras medidas alternativas, como a prestação de serviços à comunidade, acabam sendo levados à internação.
Um grande contingente de adolescentes cumprindo medida de internação na FEBEM não seriam casos para estar lá, mostrando um certo abuso na interpretação da lei e uma tendência dos magistrados a aplicarem o Estatuto como se fosse o Código Penal.
Este é um dos problemas da superlotação, que acaba sendo uma das causa das fugas.
Houve um crescimento da gravidade da natureza dos atos infracionais. No passado, o ato infracional típico era o furto, porém de décadas para cá tem havido um predomínio de atos infracionais praticados mediante violência ou grave ameaça. Ao mesmo tempo, tem aumentado a população de jovens e existe uma carência de vagas na FEBEM, pois pouco investimento tem sido feito no sentido de ampliação do número de vagas.
Assim, se juntam problemas com o Judiciário e o Executivo, pois se, de um lado, o Judiciário determina que os adolescentes fiquem internados, de outro, é dever do Executivo ampliar o número de vagas para tratar dignamente esta população.
Os adolescentes em regime de internação devem ser reeducados e não punidos. A questão das fugas acaba sendo uma conseqüência da impossibilidade de desenvolver um trabalho pedagógico, numa instituição em que existem vigilantes armados em cada canto, criando um clima de tensão, que torna impossível o estabelecimento de vínculos pedagógicos ou terapêuticos.
A Convenção Internacional dos Direitos da Criança ou as Regras Mínimas da ONU para adolescentes privados de liberdade prevêem expressamente que as Unidades nas quais os adolescentes cumprem medidas de internação não devem contar com vigilância armada, sobrepondo o ideal pedagógico ao ideal de contenção. Entretanto, teme-se relaxar a contenção para tornar possível uma pedagogia, porque isto pode propiciar fugas.
Entre os motivos apontados para as fugas, o primeiro é o anseio natural de liberdade. Não dá para imputar a responsabilidade ao aparato de segurança, reforçando a arquitetura das Unidades para evitar fugas, porque este reforçamento, de certa maneira, impede que o trabalho pedagógico se desenvolva satisfatoriamente.
É permitida a reprodução desde que citada a fonte. Grupo de Trabalho Pelo Fechamento da Febem, 31/01/2000, www.geocities.com/fecharfebem)
Sumário
Para que o sistema funcione, conforme impõe a Lei, sempre deve comportar a possibilidade de fuga.
A análise da população interna da FEBEM aponta um grande contingente de adolescentes, uma etapa da vida problemática, em que há sedimentação de valores, influência do adolescente com relação ao grupo em que ele vive. Muitas vezes o adolescente se envolve numa circunstância, que pode até ser caracterizada como roubo, mas se percebe claramente que foi um momento isolado em sua vida e mandá-lo imediatamente para uma Unidade de contenção, pode propiciar sua marginalização definitiva.
Também há um contingente de adolescentes que representa um perigo para a sociedade.
A idéia que se tem hoje é que uma pedagogia centrada na repressão e punição não funciona. O nível de reincidência do adolescente que permanece longo tempo institucionalizado é maior do que daquele em que esta ressocialização é feita em meio aberto. Uma série de teorias e estudos controlados mostram que manter o adolescente durante 5 anos separado da sociedade, torna sua reintegração problemática, sua identidade é estigmatizada, sua auto-estima fica rebaixada, ele se sente como um membro diferente da sociedade e a própria sociedade o vê de maneira diferente.
Há pouco interesse por parte do Estado em investir decisivamente em programas preventivos, em tentar alternativas para resolver o problema do adolescente infrator. Algumas Unidades de Internação são idênticas às Casas de Detenção, com celas individuais, onde os adolescente ficam em pátios com muros enormes, de noite se recolhem em celas, que são trancadas do lado de fora com grades, tudo idêntico à arquitetura de uma penitenciária.
Um outro problema é que o Judiciário e a Polícia Civil não atribuem tanta relevância à questão das fugas. Quando o adolescente foge, o fato é comunicado ao juiz, que pede para que seu oficial de justiça vá até à casa do adolescente, no endereço indicado no processo. Caso ele não se encontre em casa, o oficial de justiça informa que não o encontrou e o juiz pede para que retorne em 30 dias. O adolescente não é encontrado e o processo é arquivado, ou seja, a Polícia Civil não tem ciência, caso encontre este adolescente em alguma situação, de que ele tem a busca e apreensão decretada por fuga.
Seria preciso um trabalho de recaptura mais efetivo, de apreensão do fugitivo, pois se ele ficasse de fato cercado, desestimularia as fugas. Na realidade hoje, o que acontece é que, se ele foge e fica 1 mês fora de casa, e, a não ser que dê nova entrada no sistema por um novo ato infracional, nunca mais vai ser procurado; ele pode até, depois de um mês, voltar para casa, continuar vivendo com os pai, freqüentar os mesmos lugares, que ninguém vai mexer com ele.
As questões são urgentes e complexas, pois o Judiciário e a própria Polícia Civil não se mobilizam para que haja um repressão efetiva a estas fugas.
Com relação à fugas, seria preciso também reforçar bastante a vigilância externa aos Complexos e Unidades de internação, com patrulha policial efetiva nas cercanias para desestimular e reduzir as fugas. A Polícia não se interessa em fazer uma parceria efetiva de policiamento e patrulhamento nas proximidades dessas Unidades e a gente testemunha, como muitas vezes acontece, resgate de adolescentes em Unidades de internação, o que é um absurdo. Os adolescentes que estão lá dentro ficam à mercê de pessoas do lado de fora que vêm armados, rendem os funcionários e os resgatam.
O mau tratamento que o adolescente recebe no interior das Unidades também é um fator que enseja a fuga. O adolescente deveria estabelecer um vínculo afetivo com a instituição, para ver nela uma possibilidade de reconstrução de sua vida. Mas, na visão do adolescente, a instituição é um local no qual está sujeito à uma repressão diária e isso faz com que jamais assimile as orientações recebidas lá dentro.
O cotidiano da relação monitor-adolescente é de muita violência, o que leva a uma revolta que estimula a fuga. Em muitos processos administrativos, instaurados quando há fugas, aparece sempre entre os motivos apontados pelos adolescentes, o fato de estarem se solidarizando com um colega, que foi injustamente espancado.
Embora a FEBEM tente modificar esta visão dos monitores, a questão é complexa e precisa de um esforço mais efetivo e centralizado para ser equacionada.
A eficácia na internação depende do adolescente sentir que aquilo não é um local onde está para cumprir uma punição que foi imposta, senão ele nunca vai assimilar nada que nenhum pedagogo ou educador que está lá dentro vai passar para ele. Da forma como está, a medida de internação não funciona realmente e pior ainda, como o adolescente sofre a violência lá dentro, quando ele sair, vai entender que a violência é uma forma de resolver os problemas, o que vai acabar reforçando a índole infracional que ele já está desenvolvendo.
No Estado de São Paulo, efetivamente, a Resolução 46 de 29/10/96, do CONANDA (Anexo 2), que aponta que nas Unidades de internação o número de adolescentes não deve ser superior a 40, não está sendo atendida.
A grande maioria de adolescentes internados em São Paulo estão em Unidades com capacidade elevada. O maior foco de problemas são as Unidades de Acolhimento Provisório da Imigrantes, com capacidade para 300 vagas, mas que comportam mais de mil adolescentes. Aguarda-se investimentos do Executivo para sanar a situação.
Se o trabalho de recuperação fosse efetivo, diminuiria a reincidência e o número de infrações.
A Segurança armada é considerada, pela ONU, inadequada para Instituições de Privação de Liberdade de Adolescentes. Na FEBEM, nos casos específicos de Complexos de Unidades, que são Imigrantes e Tatuapé, há um sistema de vigilância externa, realizada por uma empresa contratada. Os vigilantes não usam armas e a vigilância interna é feita pelos monitores, que também não usam armas. Quando há tumulto, rebelião, as pessoas se armam com o que tem pela frente, porque não são preparadas para enfrentar os riscos sem o uso de armas. Até seria razoável a regulamentação do uso de algum instrumento exclusivamente de defesa para situações deste tipo, mas nunca arma de fogo.
Há uma diferença muito grande de dinâmica interna, funcionamento, estrutura física e política pedagógica de Unidade para Unidade da FEBEM. Em algumas Unidades, é desenvolvido um bom trabalho pedagógico, existe tratamento digno ao adolescente, e os resultados são razoáveis, o que deveria ser mais divulgado e servir de modelo para o todo.
Infelizmente, a maioria dos adolescentes internados estão em condições precárias. No Complexo Imigrantes existem 1000 adolescentes vivendo em situação precária. Em uma Unidade com 2 alas e um pátio grande, onde se encontram cerca de 450 adolescentes, em um dia ensolarado, com vento, ficam 200 de um lado e 200 de outro, recolhidos em um quarto pequeno assistindo televisão, muito próximos uns dos outros, por motivo de segurança, em função de uma reforma para colocar um muro divisório entre as duas alas. Isto mostra claramente como a questão da segurança entra em conflito com o tratamento digno ou o trabalho pedagógico.
A Unidade de Acolhimento Provisório da Imigrantes está condenada, precisa ser mudada urgentemente e, apesar dos esforços do Dr. Eduardo, está se perpetuando.
Atualmente o perfil do Diretor de Unidade é determinante na forma como ela funciona. O adolescente internado recebe tratamento totalmente diferenciado, dependendo da Unidade em que se encontre, apesar dos esforços de desenvolvimento de um projeto pedagógico generalizado.
Com relação às denúncias de maus tratos, assim que esta chega ao conhecimento da FEBEM, é instaurada uma sindicância interna, que vai apurar a responsabilidade funcional do agente envolvido e, paralelamente, junto a Juiz Corregedor da FEBEM, é instaurado um procedimento administrativo, onde também se apura o fato. Para ficar caracterizada a agressão é preciso um laudo de exame de corpo delito no menor, para que fique caracterizada a lesão, para, depois, aplicar uma sanção criminal ao agressor. O funcionário só é demitido quando a sindicância é conclusiva.
Infelizmente a cultura que existe entre as categorias dos profissionais que lidam diretamente com os adolescentes, mais por mal preparo, é de repressão, humilhação do adolescente. Muitas vezes, quando a direção tem o compromisso de extinguir este tipo de tratamento, e a monitoria e coordenadoria discordam, acabam minando o poder da direção, através do relaxamento da segurança e da facilitação de fugas em massa. De certa forma, a direção é refém desse corpo encarregado da segurança e do trato imediato com o adolescente.
Falta respaldo do Governo de Estado em colocar a questão da criança e do adolescente como prioritária na destinação privilegiada dos recursos, como mandam o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Convenção Internacional dos Direitos da Criança da ONU.
Para resolver o problema deveria haver uma maior integração, uma participação efetiva do Judiciário e do Ministério Público e mais atenção aos problemas da FEBEM. E também maior clareza com relação ao período da adolescência.
Como exemplos positivos dentro da FEBEM, pode-se citar: Unidade Fazenda do Carmo, onde os adolescentes têm trabalho com os animais, com a terra, em um ambiente favorável e com um número favorável de internos (40); Unidade 18 da Imigrantes; algumas Unidades do Tatuapé.
O problema do consumo de drogas nas Unidades é praticamente inexistente. Mas também inexiste um trabalho voltada a interferir na problemática, apenas a abstinência é garantida.
Propostas apresentadas: . Deputado Erasmo Dias: criação de Centros de Convivência, que funcionassem como internato ou semi-internato para atendimento a 200 crianças e adolescentes na idade de 7 a 18 anos, onde recebessem escolarização, formação militar e profissionalização, orientados por um casal de idosos. . Deputada Maria Lúcia Prandi: os funcionários que atuam diretamente com os adolescentes deveriam receber supervisão, acompanhamento psicológico, formação e avaliação permanentes, salário digno e respeito ao vínculo de afetividade construído.
É permitida a reprodução desde que citada a fonte. Grupo de Trabalho Pelo Fechamento da Febem, 31/01/2000, www.geocities.com/fecharfebem)
Sumário
=======================================
Grupo de Trabalho Pelo Fechamento da Febem Av. Sto . Amaro nº 4162 - CEP 04556-000, S. Paulo - S. Paulo, NEPPAL - tel.: 5677-8913 c/ José Roberto Grêmio SER Sudeste - tel./fax: 5565-7012 c/ Mauro A. Silva IDEAMOS - c/ Cida Gomes Escreva para o Grupo |
Vinculado ao Movimento Comunidade de Olho na Escola Pública R. Luis Góis nº 1337, CEP 04043-350, S. Paulo/SP- tel. fax: (0xx11)5565-7012 |