Amor Interestadual




O amor anda muito fácil. Não que eu tenha comprovado isso, mas é a única explicação que me vem na cabeça. Eu não cheguei aos vinte, mas ainda sou do tempo em que as preocupações eram em relação à aceitação, ciúmes, traição, insegurança, convívio, sexo... Mas pensando bem, a humanidade deve ter evoluído e se adaptado ao meio mais uma vez. Agora que tudo transcorre tranqüilamente(??!!), precisamos de algo para ocupar nossa mente, nosso coração. Algo intenso, forte, que realmente perturbe nossas noites de sono (Noites? Quem sofre com isso, não dorme necessariamente à noite) e nos leve à terapia. Que nos tire a fome e o dinheiro... A necessidade de renovação foi tanta que chegamos ao cúmulo de nos apaixonarmos por pessoas distantes. A distância... essa é a mais nova mania do amor.

Qual a graça de cair de joelhos pelo seu vizinho? A minha alma gêmea não precisa ser o menino que também usa All Stars e ouve Rancid na Osvaldo, ela pode ser o cabeludo canadense que me conta sobre suas caminhadas nas montanhas nos horários de folga. E por que não? O Canadá fica somente no outro hemisfério, não é tão longe assim... Isso é sério, pode, realmente, ser ele... mas não é necessário.

Amor a distância virou uma febre. Uma febre egoísta ainda por cima. Nas minha férias de inverno eu programava idas pra Gramado, com uma cambada de amigos. Agora tenho amigos em cada parte do Brasil, com seus respectivos namorados, namoradas... também tenho amigos de algumas partes do Brasil encontrando seus namorados e namoradas aqui em POA, mas...

Ah, é essa droga de internet. Agora todos somos brasilienses, todos nós viramos pessoas modernas. Nossos pais também. Já podemos viajar de avião e ônibus sem a autorização por escrito deles. Aliás, será que eles sabem o que é que estamos indo fazer? Será que eles sabem que nossas instalações serão meros quartos de espeluncas no interior de estados subdesenvolvidos, com um banheiro coletivo no final do corredor? Ou será que eles gostariam de saber que ficaremos a mercê de estranhos: os pais do nosso correspondente. Aliás, uma pergunta importante: a pessoa que chega a despencar de um estado ao outro para encontrar alguém já vai certa de que terá o retorno afetivo esperado?

Eu sei de histórias e histórias... sei de ratinhos indefesos, perdidos nos meandros das ruas de Porto Alegre.. sozinhos, decepcionados, rejeitados... Sei de passeios felizes, alegres e saltitantes pelas galerias de São Paulo... E do que não sei, imagino: tardes lambuzadas de rapadura e pão de queijo em Minas - pateticamente felizes.

Mas o que eu sei, acima de tudo, é da viagem de volta pra casa... o final do happy happy weekend. O retorno às mensagens, os longos e-mails, as conversas encharcadas com o melhor amigo. As dúvidas, a fidelidade a um ser distante, punição e celibato aparentemente infundados - ou absurdamente justificados. A vontade de dizer "bem feito, eu avisei".

Na verdade, eu não sei na pele, de nada disso, não desse jeito. Mas não acredito que troque minhas dificuldades amorosas, aquelas corriqueiras, clichês, comuns, habituais, enfim, freqüentes e inevitáveis, por uma dose cavalar de saudade e alegria no reencontro. Não troco meus problemas e recalques "terrenos" por um motivo a mais para teclar ou abrir o ICQ de madrugada. Meus problemas relacionados ao amor estão longe da simplicidade - ou pelo menos, longe da solução - para que eu deseje ou permita que as coisas se compliquem ainda mais. Enfim, não troco de jeito nenhum a emoção de chegar na Osvaldo e ver que quem eu quero está lá, pronto para me dar um abraço gostoso e um beijo mesmo que inocente , pelo prazer noturno de um amor interestadual.



Gabriela Mühlbach



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