EVITAR
DECEPÇÕES...
Emerson Aguiar
Mestrando
em Filosofia
Chuang
Tzu relata que, certa vez, um rapaz cheio de dúvidas em relação
ao caminho espiritual procurou Lao Tsé.
-
Por favor, ajude-me - disse o jovem - vim até o senhor porque não
consigo entender certas coisas. Quando não consigo fazer o bem,
machuco outras pessoas. Mas, quando faço o bem, machuco a mim mesmo.
Sou negligente se não cumpro com o dever de ser bondoso. Porém,
se cumpro com esse dever prejudico a mim mesmo. Como posso resolver isso?
-
Você realmente está confuso, - respondeu Lao Tsé -
está tentando medir o meio do mar com uma vara de dois metros. Você
deseja uma resposta? Observe uma criança! Ela não se preocupa
com relatórios sobre si mesma. É desinteressada. Age com
espontaneidade. Ela é parte da corrente. Não fica procurando
respostas o tempo inteiro. Mas é conduzida a elas. Esse é
o início da perfeição!
Podemos
sofrer por inúmeras razões. Até mesmo por desejarmos
melhorar. Isso soa estranho! Como podemos sofrer por aspirarmos à
perfeição e à felicidade?
O
desejo pode ser uma faca de dois gumes. Se queremos melhorar o nosso comportamento
porque descobrimos que isso, por si só, nos torna felizes e nos
dá prazer, então temos um motivo correto. No entanto, se
desejamos adquirir virtudes e cultivar qualidades por acreditarmos que,
com isso, seremos reconhecidos e bem tratados pelas outras pessoas, então
apenas criamos mais um problema.
Ou
se é bondoso porque se é, ou não se é bondoso.
As
recompensas que advêm da prática do bem, não devem
ser esperadas.
Quem
é verdadeiramente virtuoso é desinteressado como uma criança.
Pratica o bem sem pensar em retorno para si.
Existem
muitas pessoas estressadas, confusas e perturbadas em nossa sociedade.
Elas freqüentemente são agressivas ou mesmo indiferentes no
trato com o semelhante. Precisamos de uma boa dose de compaixão
e paciência para lidarmos com indivíduos assim. Só
que não podemos ser compassivos e tolerantes por muito tempo se
estivermos na expectativa de termos a nossa boa vontade identificada por
todos. E ainda que consigamos demonstrar persistência na prática
do bem diante das incompreensões e dos maus tratos, a nossa bondade
não será verdadeira se estivermos interessados em que ela
apareça.
A
história que descreve a iluminação de Sidarta ilustra
bem isso. Quando Sidarta abandonou a sua vida principesca e foi viver como
asceta, em certo momento lhe ocorreu que talvez estivesse fazendo aquilo
pelo prazer de ser admirado pelos outros. Percebendo isso, ele abandona
os rigores do ascetismo e, então algum tempo depois, ele se torna
Buda - O Iluminado.
A
mesma idéia está presente no Evangelho de Jesus segundo Lucas,
na parábola do fariseu e do publicano. Explicando esta historieta,
Jesus deixa bem claro que, quem deseja mostrar pureza, justiça e
correção, de nenhum modo é possuidor dessas qualidades.
Algo
semelhante é dito por Lao Tsé no Tao te King: “Quem dá
valor a si mesmo, não é valorizado. Quem se julga importante,
não merece importância. Quem louva a si mesmo, não
é grande.”
Aquele
que se esforça em parecer bondoso aos olhos dos homens, ou degenera
para a mais abjeta hipocrisia, ou, no caso de existirem boas intenções,
apenas consegue se frustrar com a insensibilidade alheia.
Nós
devemos seguir em nossa caminhada espiritual como uma criança, que
não tem a pretensão de ser grande ou pequena, mas apenas
quer ser o que é.
Somente
assim poderemos evitar sofrimentos e desilusões.
Não
devemos culpar o mundo pelas nossas decepções, nem atribuir
a ele a nossa amargura. Porque não é o mundo a causa do desânimo
de uma pessoa, mas sim a atitude que ela própria tem perante o mundo.
Ser
como uma criança é compreender que as virtudes não
são artigos numa vitrine. São conquistas espirituais que
se manifestam a cada nova oportunidade de fazer o bem, sem premeditação
ou interesse.