DIREITO À VIDA


 

Um dos mais graves problemas que afligem o mundo, desde sempre, é a usurpação do direito à vida; derivada, sempre, da violência, excetua-se apenas, a legítima defesa!

         Sociedades e governos de diferentes civilizações e épocas, sempre se preocuparam em salvaguardar a vida de seus cidadãos, procurando protegê-los da violência. Contudo, apesar dos grandes avanços decorrentes da evolução do homem, parece nada ter evoluído no que respeita ao primeiro de todos os direitos – o da vida!

         A solução encontrada, e que perdura até hoje, consiste na coibição da violência segundo o princípio da autoridade imposta, ou seja, usando-se da própria violência, pressupondo que os desígnios da autoridade se encontram acima da razão! Táticas mágicas ou soluções a curto prazo, não existem! Os métodos tradicionais, além de paliativos, tendem a agravar a situação a longo prazo! – combate-se a violência pela violência, gerando-se mais violência. Forma-se, assim, um ciclo vicioso e irracional, causador de sua própria autodestruição. Os violentadores, sejam eles, criminosos comuns ou os próprios agentes de “segurança”, nos atuais moldes de qualquer política societária, denotam claramente os fundamentos invertidos do mundo em que vivemos. Óbviamente, que o valor e o respeito à própria vida se anulam, para não falar no respeito ao direito alheio de viver e à liberdade da sociedade em geral. Portanto, a violência instaurada reflete-se nos indivíduos, e destes, novamente para a sociedade! Aliás, até nas sociedades onde a criminalidade está praticamente controlada, mesmo assim, este controle não se fundamenta nos princípios do respeito e do direito, e na sã formação dos indivíduos. E, como fica a liberdade tão necessária ao desenvolvimento humano com qualidade? Não é, tratando-se os “sintomas” e desprezando-se as “causas”, que o problema da violência se resolve! Como se daria, então, esta mudança da violência para a mansidade? Imediata e plenamente! Porém, tendo a consciência de que os resultados só surgiriam mais tarde, como é próprio a tudo aquilo que adquire raízes e que perdura. Enquanto isso, as forças atuais, de repressão à violência, seriam recicladas e instruídas no sentido de exercerem a coibição à violência segundo os novos critérios; das competências, da compreensão e da instauração do estado da paz. Legisladores e agentes policiais seriam investigados, no que respeita a antecedentes criminais, bem como, seu histórico familiar. Os cursos de formação específica para estes profissionais, compreenderiam novos padrões de psicologia aplicada e uma filosofia voltada para o novo modelo.Na prática; nas ruas e nos presídios, a finalidade da captura dos criminosos seria muito mais de reflexão sobre o crime cometido e de recuperação, que punitiva.A avaliação da culpabilidade, do julgamento e da pena a ser imposta, tendo em vista a segurança das pessoas, e uma possível reabilitação por parte dos criminosos, praticamente deixa de ter importância, em vista ao “fascínio” provocado pelo exercício da violência “legalizada”. Muito menos ainda, sequer havia, o menor interesse pela implantação de políticas de paz fundamentadas em valores de mansidade! Conforme esta concepção, a mansidade seria a única política contrária ao combate à violência. Portanto, desprezada e evitada! Erro este, crasso, cujas conseqüências se fazem sentir ao longo da História e se traduzem na escalada da violência que atualmente vivemos!

         A violência só se resolve estruturalmente! O antídoto: a mansidade! Resolver estruturalmente, tem a ver com a individualidade, com a pessoa, e desta para a sociedade, e não o contrário. Os métodos tradicionais, repressivos e violentos, já provaram a sua ineficácia, opondo-se radicalmente à concretização de uma paz sustentável e duradoura.

         A implantação da mansidade é um processo muito lento, que exige tempo, profundidade e interesse, que só será visto nas gerações futuras educadas segundo a mansidade, e ainda assim, limitada, tal como o é a natureza humana; porém, sólido e seguro, real e não utópico, que mais aproxima pessoa e sociedade aos mais altos níveis de desenvolvimento e bem-estar, e que em algum momento futuro da História terá de ser adotado. Infelizmente, não tanto por convicção, porquanto profundamente arraigado à cultura vigente e à impossibilidade de resultados imediatos, mas por falta de alternativa.

         A força da paz é a razão da mansidade – o proveito de bem viver individualmente e em sociedade, que transparece no semblante e na vida. Esta possível serenidade nas pessoas, e portanto, na sociedade, acha-se no interior da pessoa que exerce em si o autodomínio, conduzindo-a a uma índole pacífica e à brandura de gênio. Sem autodomínio, extingue-se a liberdade e inviabiliza-se a paz. Entenda-se que, a verdadeira liberdade não consiste na satisfação das vontades, mas sim, no domínio destas, prevalecendo a razão sobre as paixões. As frustrações de todo o tipo, a sensibilidade egocêntrica, a falta de apreço e respeito à vida,  a ambição desonesta e o espírito vingativo não autodominados, usurpam os direitos, abortam a liberdade e originam a violência.

         A perspectiva da paz estrutura-se na mansidade interior, individual, com sentido de vida, com respeito à liberdade própria e à alheia e com o aperfeiçoamento humano que convém à pessoa e ao mundo e faculta o direito de viver.


Fernando Figueirinhas


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